domingo, 23 de dezembro de 2012
A baleia Big-bang - escritores Ana Figueiredo, Pedro Figueiredo
terça-feira, 22 de maio de 2012
Cantiga de uma fada boa sobre o Carlos e Maria - Escritor João Pedro Mésseder
sexta-feira, 4 de maio de 2012
SASSAI E NIRUMBÉ - escritora Bernadete Costa
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
O PÁSSARO COLORIDO - Palmira Martins
Era uma vez um pássaro. Era de cor cinzenta e tinha um aspecto vulgar. Vivia numa enorme floresta onde havia muitas aves de todas as cores.
O Cinzento, como lhe chamavam os outros, era o mais madrugador de toda a região e também um dos melhores cantores. Além disso era, de entre todos, o que conseguia voar melhor e mais alto.
Todas as manhãs, mal apareciam os primeiros raios de sol, lá se empoleirava ele na árvore mais alta e, com os seus cantares, acordava toda a bicharada. Em seguida subia no céu e voava, voava até quase desaparecer no horizonte.
Os mais preguiçosos, que gostavam de dormir até tarde, ficavam tão zangados por aquele acordar madrugador que o gozavam por causa da sua cor e aspecto vulgar.
– Achas-te muito importante por seres bom cantor? Ainda se tivesses a minha beleza! – dizia-lhe a arara.
– Que aspecto tão vulgar e cor tão estranha! Ainda se tivesses as cores das minhas penas! Já viste alguma ave tão bonita como eu? – comentava o papagaio, empoleirado num arbusto e ainda cheio de sono a meio da manhã.
O pobre pássaro cinzento sabia que eles não tinham razão mas mesmo assim não gostava de os ouvir a troçarem do seu aspecto.
– Não lhes ligues! O que eles gostavam era de cantar e voar como tu e não conseguem! Cada um tem a sua beleza e a tua é o teu bonito canto e a tua rapidez. Não lhes ligues! – dizia-lhe a andorinha sua amiga.
Mas ele queria surpreendê-los e calar as suas vaidades. E até já andava com uma ideia na cabeça. Só estava à espera que a oportunidade surgisse.
E foi então que numa tarde cinzenta, depois de uma chuva forte, os raios de sol apareceram no horizonte e formaram um enorme e belo arco-íris.
O Cinzento encheu o peito de ar e voou, voou em direcção ao arco-íris.
As outras aves, espantadas, viram-no subir, subir no céu até quase desaparecer.
Só uma ave que treinava todas as manhãs desde o nascer ao pôr-do-sol conseguiria voar tão alto! E não é que ele conseguiu mesmo!
Quando finalmente chegou ao arco das sete cores, o pássaro rolou, rodopiou, planou, girou, virou e revirou o corpo.
Imaginem o espanto de todos os animais da floresta quando o viram descer e trazer nas penas todas as cores do arco-íris.
A partir desse dia, o Cinzento passou a chamar-se Colorido e além do mais rápido e melhor cantor é também o pássaro mais bonito da floresta.
Palmira Martins
Fevereiro de 2012
segunda-feira, 16 de janeiro de 2012
A MENINA DESPASSARADA - Nuno Higino
Era uma vez uma menina que tinha o hábito de andar com a cabeça no ar. Por isso, criou uma grande amizade com os pássaros. Eles cantavam e ela respondia cantando. Eles voavam e ela corria, desenhando círculos, como se voasse também. Eles bicavam o azul e ela sorvia o céu com os olhos. Eles desapareciam nos seus esconderijos e ela enfiava-se nos lugares mais recônditos que havia dentro de si.
Um dia, perguntaram-lhe:
- Gostas de ser como os pássaros?
E ela respondeu:
- Gosto!
- Porque gostas de ser como os pássaros?
- Porque os pássaros voam – disse prontamente.
- Mas tu não tens asas para voar.
- Voo com os olhos.
- Mas os olhos não voam.
- Isso é que voam. Voam tão longe como os pássaros.
A menina despassarada não gostava de ser interrogada, sobretudo quando lhe faziam perguntas tontas como estas. Admirava-se por não saberem que os olhos voam. E pensava: ‘como devem ser tristes as pessoas que não sabem que os olhos voam!’
Ficava com pena mas não perdia mais tempo a pensar nisso. Em vez de pensar, erguia a cabeça para o ar e pasmava a olhar os pássaros. A menina despassarada tinha os olhos grandes, muito maiores do que é habitual as pessoas terem. Era de tanta pasmar que os olhos lhe cresciam. Dentro deles cabia muito céu e à sua volta voavam os pássaros. Tinha as pernas compridas, os braços longos e uma blusa cor-de-laranja com flores no lugar dos botões. Ela sabia porque havia flores no lugar dos botões: porque não gostava de andar abotoada. Mas não sabia porque é que a blusa era cor-de-laranja e não vermelha, azul ou cor-de-rosa.
Para quem tem os olhos pequenos, os pássaros são todos iguais e a preto e branco. Quem tem os olhos grandes, como tinha a menina despassarada, vê pássaros de muitas cores. Ela via pássaros vermelhos, verdes, amarelos, roxos e de outras cores para as quais ainda não tinha encontrado nome. Não fazia mal. Dar nomes às coisas é domesticá-las e a menina despassarada queria que os seus amigos pássaros continuassem a voar livremente pelo céu além. Preferia dizer que, para além dos pássaros verdes, vermelhos, amarelos e roxos, havia outros da cor-do-vento, outras da cor-da-manhã, outros da cor-da-alegria, outros da cor-do-burro-quando-foge.
- Bom-dia, menina despassarada! – Saudou alguém que passava.
- Bom-dia – respondeu sem olhar.
- Só tens olhos para os pássaros…
- E já não é pouco – disse, sem desviar o olhar do céu.
- Se continuas assim, um dia os pássaros fazem-te ninho nos olhos.
- Deixá-lo! É melhor fazerem-me ninho nos olhos do que atrás da orelha.
Não ligou a quem a saudou, mas ficou com aquela frase a voar na cabeça: ‘um dia os pássaros ainda te fazem ninho nos olhos’. Olha que boa ideia! Era da maneira que lhe nasceriam pássaros nos olhos, centenas, milhares, milhões de pássaros a sair-lhe dos olhos e a riscarem o céu como se fossem lápis-de-cor sobre um caderno.
E não é que aconteceu mesmo? Quando chegou a primavera, veio um pássaro com um pauzinho no bico e colocou-o num dos olhos. Depois veio novamente e deixou uma ervinha. Veio outra vez e colou o pauzinho e a ervinha com um pouco de lama. Durante vários dias, incansavelmente, o pássaro construiu o seu ninho. Ainda este não tinha acabado, veio outro e fez o mesmo no outro olho. A menina despassarada tinha agora ninhos nos olhos. E, não tardou nada, os ninhos ficaram cheios de ovos. E quando chegou a altura, os ovos partiram e, de dentro deles, começaram a sair pássaros.
A menina amiga dos pássaros estava mais despassarada do que nunca. Havia chilreios em todos os lugares da sua meninice.
- A menina está com cara de quem viu passarinho verde… - disse alguém que andava por ali.
- Vi e incubei – respondeu enquanto mais pássaros lhe caíam dos olhos e se lançavam à aventura do primeiro voo.
- Que segredos não escondem esses olhos grandes…
- Os olhos escondem mais do que mostram, é verdade – anuiu a menina despassarada.
- Deixas-me morar nos teus olhos?
- Não podes, não tens alma de pássaro.
- Não me conheces, como podes dizer isso? – Impacientou-se quem andava por ali.
- As pessoas são previsíveis e só usam os olhos para roubar a inocência das coisas.
- Adeus!
A menina amiga dos pássaros olhou para trás para ver quem falava com ela. Nesse momento, caíram os ninhos que tinha nos olhos. Já não viu ninguém. Começou a passarinhar sem destino. Na próxima primavera, voltarão os pássaros para construir ninhos nos seus olhos.
Janeiro de 2012
Escritor Nuno Higino